A partir de aprendizados com agentes que produzem conhecimento
Nessa noite pensei na gente e no rio.
A gente faz um esforço para morar aqui
e viver nessa luta também com o rio.
Acho que a gente tem que trabalhar
junto para melhorar esse nosso lugar,
mas também fiquei pensando no rio:
o que ele acha disso tudo e de todo
esse movimento de sobe, desce,
molha, seca, adoece e cura,
Ai meu São Benedito!
Dona Herculina

A busca incessante de soluções urbanas para os territórios da Várzea do Tietê, localizados na Zona Leste de São Paulo, reforça a convicção de que devemos ampliar o olhar para compreensão ecossistêmica desses territórios, o que implica articular seus territórios e comunidades numa arquitetura de estratégias e ações que efetivamente possam provocar transformações nessa região, compondo uma inteligência conectiva, construída na intersecção de conhecimentos que se interdisciplinarizem e considerem no desenho urbano elementos mnenômico-subjetivos, toponímicos, do vinculo das pessoas e a forma como essas porções de terra foram configuradas e habitadas.

Falar em redução das desigualdades socioespaciais em uma região como a que apontamos, ou nos territórios nascidos do fenômeno do espraiamento da cidade, perpassa trabalhar, a princípio, com componentes geoprocessuais para diagnóstico numa unidade de intervenção urbana participativa composta de: a) mapa infraestrutural de base hídrica, energia e drenagem; b) Mapa dos equipamentos sociais públicos; c) Mapa da ocupação do espaço urbano; d) Mapa da sociedade civil: e) Mapa mnemônico – subjetivo, toponímias e vínculos.
Falar em redução das desigualdades socioespaciais em uma região como a que apontamos, ou nos territórios nascidos do fenômeno do espraiamento da cidade, perpassa trabalhar, a princípio, com componentes geoprocessuais para diagnóstico numa unidade de intervenção urbana participativa composta de: a) mapa infraestrutural de base hídrica, energia e drenagem; b) Mapa dos equipamentos sociais públicos; c) Mapa da ocupação do espaço urbano; d) Mapa da sociedade civil: e) Mapa mnemônico – subjetivo, toponímias e vínculos.
Trabalhar com estratégias de intervenção urbana para áreas de 30 a 35 hectares com população de 12 a 15 mil pessoas possibilita participação direta efetiva das comunidades, estruturando bases e princípios para uma governança e gestão territorial, o que engloba também o compartilhamento do conhecimento e tornando público como funciona a cidade em sua estrutura administrativa”, mais os mecanismos, legislação e processos do orçamento público municipal.
As adversidades dos territórios na relação com as microbacias do Alto Tietê e as condições desses espaços urbanos exige estudá-los, pensá-los junto com as pessoas que vivem nessa região, suas condições socioambientais e infraestruturais, uma escuta sensível das crianças e adolescentes para desenhar políticas públicas e condições de vida digna, sendo imprescindível conectar inteligências existentes nas Universidades, Poder Público, Iniciativa Privada, Organizações da Sociedade Civil e Comunidades o que implica também proteger, educar, e considerar preponderante a participação política das pessoas que vivem nessas áreas, objetivando coesão de propósitos e mobilização e entender o estado não só como esfera governamental, mas num sentido mais amplo de participação e de corresponsabilidade comunitária.
No ponto de vista governamental, nessa lida de viver, articular e aprender sobre o ecossistema da Várzea do Tietê, reafirmar e cobrar a responsabilidade da Prefeitura, o Estado e a Inciativa Privada para que assumam o co-protagonismo de investimentos, por exemplo, para ações de saneamento básico, promovendo a revisão do Plano de Saneamento para as áreas de Várzea, dentre elas a maior com 75 km de extensão que é a do Tietê, como também cobrar mais atuação qualificada dos órgãos estaduais, na operação das águas e energia, preservação de suas margens como prevê a legislação da Área de Proteção Ambiental do Tietê que muitas vezes se hibridiniza com Zonas Especiais de Interesse Social – ZEIS 1 e que são despossuídas de planificação e qualificação do espaço urbano, além de muitas vezes estarem localizadas nas fronteiras de cidades da região metropolitana, o que provoca mais letargia, diante do desinteresse dos municípios em áreas limítrofes, tanto mais, pela ausência de uma política consistente de desenvolvimento metropolitano.
Assim, os órgãos estaduais e municipais, detentores de conhecimento técnico e científico e que são, por exemplo, responsáveis pela operação das águas, controle dos recursos hídricos, ambientais e pela aplicação de políticas urbanas voltadas à infraestrutura e habitação, necessitam abrir suas escutas e integrar a colaboração de outros agentes e, a recíproca é verdadeira, no que se refere aos demais agentes da Academia e da Sociedade Civil. Aqui nos referimos àqueles atores que desenvolvem desde tecnologias para soluções urbanas, como drenagem, estrutura física de saneamento, controle do fluxo das águas pluviais, por exemplo, até os que trabalham no desenvolvimento de tecnologias sociais voltadas para a defesa e garantia de direitos.
Uma experiência recente traz uma referência da orquestração entre agentes de desenvolvimento. Um território de Várzea, o Jd Lapenna, com suas singularidades, mas com muitas similaridades com outros territórios dessa região de Várzea do Tietê, um terreno urbano localizado numa planície aluvial, entre as extremidades do final de duas microbacias. Uma planície aluvial é composta como o nome indica de aluvião, um solo produzido pela acomodação do Tietê, um rio de planície e como todo rio de planície corre devagar, mas que em tempos de chuva reconhece como suas as áreas que passaram a ser habitadas pela população que busca um espaço para morar.
Para entender melhor é importante observar que solos de planícies aluviais, sofrem mudanças constantes em sua “textura” tornando-se ora permeáveis, ora sedimentados conforme o movimento do rio, sendo que a infraestrutura urbana preexistente na Várzea está sobre as antigas sedimentações, que configuram uma espécie de platô, mais elevada, produzida pelo movimento das águas a levar sedimentos e, ao longo do tempo, criou uma espécie de espaço mais elevado.
Recentemente esse território, Jd Lapenna, construiu um plano participativo de desenvolvimento urbano e um dos indicadores de sucesso, sem dúvida, além da criação de um conselho gestor, foi a de incidir no orçamento municipal.
As áreas de Várzea do Rio Tietê possuem uma configuração físico-territorial longitudinal, apresentando uma extensa área plana com declividades, em média, inferiores a 5%, e larguras variando entre 200 e 600 metros, podendo atingir até mil metros em alguns pontos que correspondem aos terrenos sujeitos às inundações anuais do rio, na época das chuvas. Esse espaço que pertence ao rio, hoje também pertence às comunidades, o que exige dos atores projetos que tenham em seu escopo melhorar a relação entre gentes, rios e córregos e todo o ecossistema recuperável ou emergente advindo dessa relação.
No que diz respeito à relação gentes e rio Tietê, sempre se pensa em intervenções ora para desenvolver operações para capacitar o território para viver nesse espaço, ora para permitir ao rio sua livre acomodação, ou desconsiderar a acomodação natural do rio e priorizar a presença humana. Mas essas operações se tornam inócuas se não se desenvolverem, antes, planos de desenvolvimentos territoriais, a partir de unidades territoriais como citamos de áreas de 30 a 35 hectares com população de 12 a 15 mil e integrando-as numa política de desenvolvimento de uma região.
Assim, além de perceber a necessidade de atuar para a planificação e execução de planos de gestão territorial que considere a participação, a governança local e a articulação de ativos de conhecimento que se identificam com o propósito de uma estratégia de ações territoriais integradas, faz – se necessário investir na articulação de agentes públicos, universidades, sociedade civil e iniciativa privada para a efetivação de uma inteligência conectiva e colaborativa voltada à uma extensa área da Várzea do Alto Tietê, no que diz respeito à infraestrutura urbana e justiça social.
Uma Frente de Desenvolvimento Integrado e Participativo da Várzea do Tietê tem potencial para produzir um movimento de “concertação” voltado para uma proposta que considera, não somente o espectro físico, mas que dialoga também com a cocriação e apropriação das comunidades de tecnologias, suas subjetividades refletidas no desenho urbano, a memória na perspectiva concreta de participação social, planejamento participativo, aliado a um trabalho educativo, fundamental para que haja legitimidade e participação comunitária no definir, agir e transformar esses territórios.
A frase de Dona Herculina coincide com o livro “Carne e Pedra – o corpo e a cidade na civilização ocidental”, de Richard Sennett. No livro, Sennett nos conta que no século IX surgiu a primeira ideia de comunidade criada por São Benedito, decretando que os monges deveriam passar os dias trabalhando e rezando – laborare et orare – o labor deveria se concentrar no jardim (aliás uma alusão a compensação do pecado do jardim do Éden). O ofício cristão estava associado à garantia do refúgio contra o mundo de pecados.
Dona Herculina reflete sobre a relação da comunidade com o rio e insinua um pensamento mais ecossistêmico, sem a ideia de comunidade voltada para a compensação de pecados, mas num exercício de alteridade entre também se colocar no lugar do rio e ampliar a compreensão de viver onde ela passou a habitar.
José Luiz Adeve (Cometa)
Trabalhar com estratégias de intervenção urbana para áreas de 30 a 35 hectares com população de 12 a 15 mil pessoas possibilita participação direta efetiva das comunidades, estruturando bases e princípios para uma governança e gestão territorial, o que engloba também o compartilhamento do conhecimento e tornando público como funciona a cidade em sua estrutura administrativa”, mais os mecanismos, legislação e processos do orçamento público municipal.
As adversidades dos territórios na relação com as microbacias do Alto Tietê e as condições desses espaços urbanos exige estudá-los, pensá-los junto com as pessoas que vivem nessa região, suas condições socioambientais e infraestruturais, uma escuta sensível das crianças e adolescentes para desenhar políticas públicas e condições de vida digna, sendo imprescindível conectar inteligências existentes nas Universidades, Poder Público, Iniciativa Privada, Organizações da Sociedade Civil e Comunidades o que implica também proteger, educar, e considerar preponderante a participação política das pessoas que vivem nessas áreas, objetivando coesão de propósitos e mobilização e entender o estado não só como esfera governamental, mas num sentido mais amplo de participação e de corresponsabilidade comunitária.
No ponto de vista governamental, nessa lida de viver, articular e aprender sobre o ecossistema da Várzea do Tietê, reafirmar e cobrar a responsabilidade da Prefeitura, o Estado e a Inciativa Privada para que assumam o co-protagonismo de investimentos, por exemplo, para ações de saneamento básico, promovendo a revisão do Plano de Saneamento para as áreas de Várzea, dentre elas a maior com 75 km de extensão que é a do Tietê, como também cobrar mais atuação qualificada dos órgãos estaduais, na operação das águas e energia, preservação de suas margens como prevê a legislação da Área de Proteção Ambiental do Tietê que muitas vezes se hibridiniza com Zonas Especiais de Interesse Social – ZEIS 1 e que são despossuídas de planificação e qualificação do espaço urbano, além de muitas vezes estarem localizadas nas fronteiras de cidades da região metropolitana, o que provoca mais letargia, diante do desinteresse dos municípios em áreas limítrofes, tanto mais, pela ausência de uma política consistente de desenvolvimento metropolitano.
Assim, os órgãos estaduais e municipais, detentores de conhecimento técnico e científico e que são, por exemplo, responsáveis pela operação das águas, controle dos recursos hídricos, ambientais e pela aplicação de políticas urbanas voltadas à infraestrutura e habitação, necessitam abrir suas escutas e integrar a colaboração de outros agentes e, a recíproca é verdadeira, no que se refere aos demais agentes da Academia e da Sociedade Civil. Aqui nos referimos àqueles atores que desenvolvem desde tecnologias para soluções urbanas, como drenagem, estrutura física de saneamento, controle do fluxo das águas pluviais, por exemplo, até os que trabalham no desenvolvimento de tecnologias sociais voltadas para a defesa e garantia de direitos.
Uma experiência recente traz uma referência da orquestração entre agentes de desenvolvimento. Um território de Várzea, o Jd Lapenna, com suas singularidades, mas com muitas similaridades com outros territórios dessa região de Várzea do Tietê, um terreno urbano localizado numa planície aluvial, entre as extremidades do final de duas microbacias do Itaqueruna e a do Jacu. Uma planície aluvial é composta como o nome indica de aluvião, um solo produzido pela acomodação do Tietê, um rio de planície e como todo rio de planície corre devagar, mas que em tempos de chuva reconhece como suas as áreas que passaram a ser habitadas pela população que busca um espaço para morar.
Para entender melhor é importante observar que solos de planícies aluviais, sofrem mudanças constantes em sua “textura” tornando-se ora permeáveis, ora sedimentados conforme o movimento do rio, sendo que a infraestrutura urbana preexistente na Várzea está sobre as antigas sedimentações, que configuram uma espécie de platô, mais elevada, produzida pelo movimento das águas a levar sedimentos e, ao longo do tempo, criou uma espécie de espaço mais elevado. Recentemente esse território, Jd Lapenna, construiu um plano participativo de desenvolvimento urbano e um dos indicadores de sucesso, sem dúvida, além da criação de um conselho gestor, foi a de incidir no orçamento municipal.
As áreas de Várzea do Rio Tietê possuem uma configuração físico-territorial longitudinal, apresentando uma extensa área plana com declividades, em média, inferiores a 5%, e larguras variando entre 200 e 600 metros, podendo atingir até mil metros em alguns pontos que correspondem aos terrenos sujeitos às inundações anuais do rio, na época das chuvas. Esse espaço que pertence ao rio, hoje também pertence às comunidades, o que exige dos atores projetos que tenham em seu escopo melhorar a relação entre gentes, rios e córregos e todo o ecossistema recuperável ou emergente advindo dessa relação.
No que diz respeito à relação gentes e rio Tietê, sempre se pensa em intervenções ora para desenvolver operações para capacitar o território para viver nesse espaço, ora para permitir ao rio sua livre acomodação, ou desconsiderar a acomodação natural do rio e priorizar a presença humana. Mas essas operações se tornam inócuas se não se desenvolverem, antes, planos de desenvolvimentos territoriais, a partir de unidades territoriais como citamos de áreas de 30 a 35 hectares com população de 12 a 15 mil e integrando-as numa política de desenvolvimento de uma região.
Assim, além de perceber a necessidade de atuar para a planificação e execução de planos de gestão territorial que considere a participação, a governança local e a articulação de ativos de conhecimento que se identificam com o propósito de uma estratégia de ações territoriais integradas, faz – se necessário investir na articulação de agentes públicos, universidades, sociedade civil e iniciativa privada para a efetivação de uma inteligência conectiva e colaborativa voltada à uma extensa área da Várzea do Alto Tietê, no que diz respeito à infraestrutura urbana e justiça social.
Uma Frente de Desenvolvimento Integrado e Participativo da Várzea do Tietê tem potencial para produzir um movimento de “concertação” voltados para uma proposta que considera, não somente o espectro físico, mas que dialoga também com a cocriação e apropriação das comunidades de tecnologias, suas subjetividades refletidas no desenho urbano, a memória na perspectiva concreta de participação social, planejamento participativo, aliado a um trabalho educativo, fundamental para que haja legitimidade e participação comunitária no definir, agir e transformar esses territórios.
A frase de Dona Herculina coincide com o livro “Carne e Pedra – o corpo e a cidade na civilização ocidental”, de Richard Sennett. No livro, Sennett nos conta que no século IX surgiu a primeira ideia de comunidade criada por São Benedito, decretando que os monges deveriam passar os dias trabalhando e rezando – laborare et orare – o labor deveria se concentrar no jardim (aliás uma alusão a compensação do pecado do jardim do Éden). O ofício cristão estava associado à garantia do refúgio contra o mundo de pecados.
Dona Herculina reflete sobre a relação da comunidade com o rio e insinua um pensamento mais ecossistêmico, sem a ideia de comunidade voltada para a compensação de pecados, mas num exercício de alteridade entre também se colocar no lugar do rio e ampliar a compreensão de viver onde ela passou a habitar.
José Luiz Adeve (Cometa)